sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Marcas (des)necessárias


13 de Maio de 2009
Era como se nada mais fizesse sentido. Não tinha como esquecer o acontecido, havia marcas. Marcas que representavam as minhas dores, marcas de como meu pai realmente era.
Desde pequeno eu era diferente. Gostava de coisas que os outros meninos não gostavam, sempre ficava brincando com as meninas. Implicavam comigo, mas eu não ligava, afinal eu era apenas criança. Isso não mudou. Ao contrário do que pensam que quando se torna adolescente tudo muda e as brincadeiras de criança ficam para trás, não aconteceu comigo. Tudo ficou pior. Muito pior, até mais dolorido pode se dizer.
Com o tempo fui descobrindo quem eu realmente era. E assim descobri também quem meu pai realmente era, e o que descobri não foi bom. Quando disse que era diferente, não quis dizer que eu tinha problemas ou algo do gênero. Para alguns isso poderia até ser chamado de doença, mas para mim era apenas quem eu era. Homossexual.
Para quem não sabe isso significa que eu gosto de pessoas do mesmo sexo que eu, homens. Por morar somente com meu pai foi mais difícil conviver com essa realidade, porque ele praticamente me obrigava a ser o que eu não era. Sempre me questionava sobre namoros e garotas, eu acabava fugindo do assunto. Porém isso não adiantou para que as coisas seguissem da maneira certa.
Um belo dia ele me viu conversando com um dos meus amigos, gay. Não foi uma cena muito agradável, pois ele não foi simpático e depois no carro falou demais sobre o que achava desse tipo de amizade para mim. Foi o cúmulo. Chegamos a minha casa ainda brigando e eu não aguentei e soltei a bomba.
Gritei dizendo que eu era homossexual e que ele não poderia fazer nada para mudar aquilo, teria que me aceitar como eu era. Primeira reação, choque. Depois pavor, dor e raiva. Depois desse dia minha vida só piorou. Além de ser completamente ignorado pelo meu pai eu ainda era violentado. Violentado por uma pessoa que eu não considerava mais da minha família.
Um dia perguntei o porquê de ele me bater tanto, ele respondeu que era para eu me tornar homem de verdade. Chorei. Mais dor.
Todos os dias era a mesma coisa. Eu chegava do colégio e era recebido com mais e mais pancadas de tudo que era jeito. Ele começava me dando socos nos braços, nas costas, no rosto e depois me batia com o cinto. Eu tentava correr, mas ele jogava o que estivesse pela frente. Como no dia em que eu estava tentando escapar da violência e comecei a correr, ele estava quase me alcançando e escorregou no tapete e jogou o ferro de passar roupas que ficava guardado atrás da porta. Até hoje tenho a marca nas minhas costas. Quando passo a mão ainda sinto a dor que senti naquele momento.
Meu pai sentia mais raiva quando percebia que eu não estava mudando e sentia mais dor e desprezo pela pessoa que um dia eu chamei de PAI. Eu sempre me perguntava quando aquilo tudo acabaria e sofria mais. Comecei a cogitar em fugir de casa ou até mesmo de me matar. Eu arrumava as minhas coisas, esperava meu pai dormir e escapava pela janela, porém acabava voltando durante o dia. Não sabia como era o mundo lá fora, não sabia como me virar sozinho e o que mais eu temia: não sabia como as pessoas reagiriam em relação à minha opção sexual. 
Não conseguia me matar, tinha medo. Por mais que eu pensasse que seria um alivio para o meu pai, não conseguia me matar. Era como se uma parte de mim ainda tivesse esperanças de que ele mudasse e me apoiasse pelo que sou. Enquanto isso eu vou vivendo nas esperanças. Quem sabe uma luz ainda possa iluminar essa escuridão de dor em que estou vivendo.

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